Caminhamos na Estrada de Jesus

"CAMINHAMOS NA ESTRADA DE JESUS"


QUEM É JESUS NO EVANGELHO DE MARCOS

·         O “Filho de Deus”, título que aparece 07 vezes no texto de Marcos. 07 é um número que indica perfeição: (1,1; 1,14; 1,15; 8,35; 10,29; 13,10 e 14,9).
·         O “Cristo”, o Messias prometido por Deus, através dos Profetas, no Antigo Testamento e esperado pelo povo de Deus. Também aparece 07 vezes no texto marcano: (1,1; 8,29; 9,41; 12,35; 13,21; 14,61 e 15,32).
·         O “Filho do Homem”: são 14 citações. Este título expressa a natureza humana à natureza divina, sua autoridade, humilhação, servidão e testemunho. (2,10. 28; 8,31. 38; 9,9. 12.31; 10,33. 45; 13,26; 14,21[2]. 62).
·         O “Filho Amado” do Pai, no batismo (1,11) e na transfiguração (9,7) de Jesus.
·         O “Mestre” são 16 citações nas quais Jesus é chamado como aquele que ensina: (4,38; 5,35; 9,17. 38; 10,17. 20.35; 12,14. 19.32; 13,1; 14,14); o “Rabi” (9,5; 11,21; 14,45) ou “Rabbúni” (10,51).
·         O “Servo” profetizado por Isaías (40-55), que veio para “servir e não para ser servido” (10,45).
·         O “Senhor do Sábado” que perdoa os pecados (2,10. 28) e revela os Mistérios do Reino (cap. 4).
·         O “Ressuscitado” (16,6). A fé no Jesus Ressuscitado deu início e impulso às primeiras comunidades!
·         “Tu és o Cristo (8,28)!” Esta confissão de Pedro é como o centro do evangelho de Marcos.
No texto de Marcos Jesus é o libertador que passou fazendo o bem e ensinando, enfrentando os “demônios” e curando os enfermos, libertando as pessoas dos seus males e integrando-as novamente na sociedade. Com gestos, atitudes e palavras anunciou com a vida o Reino de Deus. “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus (15,39) é um convite e a conclusão de que todos devem chegar ao caminhar com Jesus. Este centurião representa todos aqueles que estão à procura de Jesus.
E para você, quem é Jesus de Nazaré?


QUEM DIZEM OS HOMENS QUE EU SOU?

UMA LEITURA DE MARCOS 8,27-38

Jesus partiu com seus discípulos para os povoados de Cesareia de Filipe e, no caminho, perguntou a seus discípulos: “Quem dizem os homens que eu sou?” Eles responderam: “João Batista; outros, Elias; outros, ainda, um dos profetas”. “E vós”, perguntou ele, “quem dizeis que eu sou?” Pedro respondeu: “Tu és o Cristo”. Então, proibiu-os severamente de falar a alguém a seu respeito (Mc 8,27-30).

Quem é Jesus? Questão central e decisiva na comunidade de Marcos, diante do surgimento de várias lideranças populares por volta do ano 70. Para a comunidade, que professava Jesus morto e ressuscitado como “Cristo”, a compreensão da identidade e da missão de Jesus era, ao mesmo tempo, a compreensão da missão dos cristãos: quem eram os verdadeiros discípulos e as discípulas de Jesus de Nazaré?
A pergunta “Quem dizem os homens que eu sou?” atravessa milênios e continua em discussão, oferecendo várias imagens de Jesus: milagreiro, rei triunfante, sacerdote, psicólogo, monge, economista, revolucionário etc. Cada imagem revela uma faceta da vivência de um indivíduo cristão. Pois a essência da pessoa humana de Jesus com sua proposta de vida é fundamental para viver a fé cristã. Hoje a pergunta de Jesus continua nos interpelando: “Quem dizem os homens que eu sou?” Para responder melhor a essa pergunta, é preciso, primeiramente, situá-la no contexto histórico em que Jesus e a comunidade de Marcos viveram.

1. Situando na história
            O pano de fundo histórico da febre messiânica, que contagiava e movimentava o povo de Israel no primeiro século d.C., é consequência do fracasso do movimento dos macabeus (166-63 a.C.) e da ascensão e dominação do poder romano (63 a.C.-135 d.C.). Depois de grande sofrimento e opressão sob as três dominações estrangeiras (babilônica, persa e grega), o povo depositou grande esperança nas mãos dos macabeus. Esperava que eles fossem os líderes verdadeiros que iriam libertar o povo do jugo dos opressores. Mas fracassaram! O movimento dos macabeus desembocou na formação de uma monarquia tão opressora quanto a dos gregos. Eles se preocupavam apenas com o interesse e a segurança de sua dinastia, a dos “asmoneus”. A velha história se repete!
            A frustração aumentou com a chegada dos romanos e do seu tremendo poderio militar. O povo se submeteu impotente às ordens humilhantes de mais uma potência estrangeira que chegou para devastar sua pátria. A devastação acontecia não somente no campo de tributos e comércio (moedas), mas também no campo cultural e religioso. Os imperadores, por exemplo, apresentavam-se como filhos de Deus, filhos do cometa e sumos sacerdotes. A história relata dois exemplos de imposição cultural e religiosa dos imperadores que provocaram indignação e revolta nos judeus e poderiam ter provocado um banho de sangue: os estandartes militares de Pilatos com a imagem do imperador César marchando para Jerusalém (26-27 d.C.) e a tentativa de erguer a estátua do imperador Caio Calígula no templo de Jerusalém (40-41 d.C.).
E, para piorar a situação do povo, os romanos nomearam os idumeus, inimigos dos judeus, para reger a Palestina: Herodes Magno e seus filhos (Arquelau, Antipas e Filipe), cujos reinados foram marcados pela brutalidade e tirania, espalhando ódio e desespero no meio do povo. Arquelau, por exemplo, sufocou a revolta dos judeus de Jerusalém, massacrando 3 mil pessoas na praça do Templo na Páscoa. Os reis herodianos promoveram a ostentação do luxo segundo o estilo romano, construindo palácios em cidades como Cesareia, Jerusalém, Séforis, Tiberíades, Jodefá etc. Aumentaram os tributos, assim como intensificaram a exploração, a opressão e a violência contra os camponeses, que constituíam 90% ou mais da população da Palestina. Era comum presenciar famílias inteiras sendo vendidas como escravos por causa de dívidas.
Infelizmente, os líderes religiosos de Jerusalém praticamente não fizeram nada diante da situação do povo; ao contrário, o desempenho deles visava aos próprios interesses e privilégios, obtendo lucro também por meio da colaboração com o império. Um dos relatos da época registra o abuso cometido pelo sumo sacerdote Ismael (59-61 d.C.):

Naquela época, o Rei Agripa conferiu o sumo sacerdócio a Ismael, filho de Fiabi. Surgiu então mútua inimizade e luta de classe entre os sumos sacerdotes, de um lado, e os sacerdotes e líderes do populacho de Jerusalém, do outro […]. Era tamanha a falta de vergonha e a afronta da parte dos sumos sacerdotes, que descaradamente enviavam escravos à entrada de suas casas para receber os dízimos devidos aos sacerdotes, resultando daí que, sem nada ter, os pobres religiosos morriam de fome (Flávio Josefoapud CROSSAN; REED, 2007, p. 235).[1]

Os governantes religiosos estavam envolvidos com extorsão e ladroeiras, transformando o Templo num “covil de ladrões” (Mc 11,17). O povo vivia em completo abandono. Nesse caldeirão de tensões sociais, políticas, econômicas, culturais e religiosas renascem e crescem os movimentos de resistência com visões escatológicas e apocalípticas do reino de Deus: Deus intervém e transforma o mundo do mal, da injustiça e da violência num mundo de justiça e de paz. Os movimentos resultaram em duas grandes revoltas nos primeiros cem anos do domínio romano: no ano 4 a.C., com cerca de 2 mil rebeldes crucificados em Jerusalém, e em 66-73 d.C., na Guerra Judaica, com a destruição do Templo e da cidade de Jerusalém.
No primeiro século havia vários movimentos de resistência ao domínio romano. Vejamos os que são conhecidos:

1)      Banditismo judaico: os camponeses endividados e expulsos de suas terras se refugiavam nas montanhas e se juntavam aos salteadores. Atacavam as caravanas romanas e faziam incursões nas áreas fronteiriças. Flávio Josefo, historiador e colaborador de Roma, falando sobre o banditismo judaico da década de 30 d.C., informou: “Salteadores que viviam em cavernas estavam devastando grande parte da zona rural e infligindo aos habitantes calamidades não menores que as de uma guerra” (G.J.1.304 – HORSLEY; HANSON, 1995, p. 76). Os bandidos, na verdade, mantinham contato com os camponeses das aldeias, compartilhavam os mesmos valores culturais e religiosos e muitas vezes faziam justiça em favor dos habitantes locais. Os habitantes, por sua vez, geralmente os apoiavam e até arriscavam a vida para protegê-los. Na Galileia, esse movimento do banditismo era suficientemente forte para ameaçar e levantar-se em rebelião contra seus dominadores, judeus e romanos, e, com um líder bem-sucedido, o movimento tornava-se uma esperança escatológica para o povo explorado e empobrecido.
2)      Movimentos messiânicos com reis populares: os camponeses em dificuldade juntavam-se a algum movimento messiânico sob a liderança de um rei carismático. Eles sonhavam com um líder como o rei Davi e o “filho do homem” (Dn 7), que poderia estabelecer o reinado definitivo de Israel, derrotando os romanos e expulsando os governantes corruptos. Na época de Jesus, o povo seguia vários “reis messiânicos”, como Judá, filho de Ezequias, Sião, ex-escravo de Herodes, Atronges, um pastor etc.
3)      Movimentos proféticos: no primeiro século, constata-se o renascimento de profetas com as características transmitidas na tradição bíblica (Elias, Amós, Oseias, Miqueias, Jeremias etc.). Eles, como João Batista, denunciavam as injustiças e anunciavam o julgamento iminente de Deus. Alguns deles inspiravam e lideravam até um movimento de revolta contra as autoridades, como no caso dos profetas samaritanos, por volta de 30 d.C.

Nesse contexto histórico de constantes ondas de revoltas populares, Jesus de Nazaré aparece diante do povo com a fama de ser um profeta.

2. Jesus de Nazaré
Nem sempre é fácil descrever o Jesus histórico e sua vida. Nos evangelhos, misturam-se as atividades de Jesus e as interpretações feitas, posteriormente, pelas comunidades cristãs. Mas é inegável que ele é originário da aldeia de Nazaré e passou a maior parte da sua vida pregando, atuando e andando de uma aldeia para outra na Galileia. Seus atos, ensino, ditos e parábolas eram enraizados nas experiências da vida camponesa da sua terra. Eis algumas práticas de Jesus que se diferenciavam da imagem oficial do Messias daquele tempo (NAKANOSE, 2004, p. 115):

1)      Jesus anuncia a boa-nova, primeiramente, aos pobres da Galileia. Essa região não é, para a elite judaica, o lugar apropriado para a aparição do Messias: “De Nazaré pode sair algo de bom?” (Jo 1,46).
2)      Jesus critica a lei da pureza: Jesus vive no meio dos marginalizados, toca o leproso (Mc 1,41), come com os pecadores (Mc 2,15) e acolhe a mulher impura (Mc 5,25-34). O que ele está propondo é reincorporar os marginalizados na vida social em vez de excluí-los pela Lei discriminatória. Devolve-lhes a alegria de viver como gente! Essa atitude de Jesus desafia a imagem do Messias como mestre e guardião da Lei oficial, por quem os fariseus e os essênios esperavam (Mc 7,1-7).
3)      Jesus não manda nas pessoas nem as domina, mas veio para servi-las (Mc 10,45). Essa prática não segue a regra do Messias rei vitorioso que instaura o reinado de Deus mediante a violência e a dominação. A prática da libertação não se baseia no poder, mas no serviço. Quem usa o poder para libertar o povo corre o risco de subjugá-lo com o mesmo poder (Mc 9,33-37; 10,42-45).
4)      Jesus é descrito como o profeta Jeremias, desafiando as autoridades judaicas estabelecidas no Templo: “Não está escrito: Minha casa será chamada casa de oração para todos os povos? Vós, porém, fizestes dela um covil de ladrões!” (Mc 11,17; Jr 7,11). Essa é a causa principal da ira das autoridades do Templo, considerado por muitos como o local onde o Messias vai se apresentar e começar a sua conquista e seu domínio triunfante (Lc 4,9).

A imagem do Messias que nasce da prática de Jesus se contrapôs à poderosa figura messiânica davídica esperada pelo povo judeu. Ele é o “servo sofredor” (Is 42,1-9), que prega e pratica um relacionamento social e religioso baseado no amor, na compaixão e na justiça, o que o leva a um confronto com as autoridades e, consequentemente, à cruz. O sofrimento e a morte de Jesus não são castigos nem projeto de Deus, mas consequência de sua prática da justiça e da solidariedade.
Os primeiros seguidores e seguidoras, que conseguiram compreender esse messianismo do servo após a morte de seu mestre e a experiência pascal, colocaram-se ao lado dos crucificados da sociedade para construir o reino de Deus, de amor e solidariedade. Porém, foi difícil seguir o projeto do Jesus servo sofredor na sociedade greco-romana, controlada pelo império que pregava e buscava poder, riqueza, posição social, honra, fama etc. É também muito grande a tentação de imaginar e pregar Jesus como rei triunfante e profeta poderoso nas dificuldades e nos momentos de perseguição. A comunidade de Marcos não foi exceção. Ela enfrentou a crise de identidade: quem é Jesus e qual a sua missão nos movimentos de resistência contra o império existentes na Galileia.

3. A figura messiânica e a comunidade de Marcos
            Após a morte de Herodes Agripa I (44 d.C.), a Judeia voltou a ser província romana. Com a perda da autonomia política da Judeia e a terrível fome no fim dessa década, a Palestina presenciou o aumento sucessivo dos movimentos violentos de resistência, o qual atingiu seu ápice na Guerra Judaica de 66-73:
1)      O banditismo aumentou em proporções epidêmicas. Os principais líderes carismáticos foram: Eleazar bem Dinai; Tolomau; Jesus, filho de Safias etc.
2)      Os reis e os profetas messiânicos prometiam a libertação do jugo dos romanos e reuniam enorme movimento popular: o rei messiânico Manaém, filho de Judas, o Galileu; o profeta Egípcio etc.
3)      Os sicários, que apareceram na década de 50 d.C., sequestraram, assassinaram os aristocratas colaboradores dos romanos, provocaram agitações a favor da liberação judaica e, finalmente, aderiram aos grupos rebeldes na luta contra o império em 66-70.

No fim da década de 60, toda a Palestina estava infestada de movimentos de revolta, que agitavam a comunidade de Marcos. A comunidade se juntaria à revolta armada com a bandeira do rei Jesus messiânico? A dúvida e indecisão da comunidade estão manifestadas em seu texto:

Pois naqueles dias haverá uma tribulação tal, como não houve desde o princípio do mundo que Deus criou até agora, e não haverá jamais. E se o Senhor não abreviasse esses dias, nenhuma vida se salvaria; mas, por causa dos eleitos que escolheu, ele abreviou os dias. Então, se alguém vos disser: “Eis o Messias aqui” ou “ei-lo ali”, não creiais. Hão de surgir falsos Messias e falsos profetas, os quais apresentarão sinais e prodígios para enganar, se possível, os eleitos. Quanto a vós, porém, ficai atentos. Eu vos preveni a respeito de tudo (Mc 13,19-23).

Quem é Jesus? A comunidade de Marcos trata do assunto do messianismo de Jesus de modo particular. Olhando, sobretudo, a primeira parte do Evangelho de Marcos (Mc 1,1-8,26), o leitor logo percebe as constantes ordens de silêncio depois da prática poderosa e libertadora de Jesus e da menção de seus títulos. Eis a lista dessas ordens:

1)      “Na ocasião, estava na sinagoga deles um homem possuído por um espírito impuro, que gritava, dizendo: ‘Que queres de nós, Jesus nazareno? Vieste para arruinar-nos? Sei quem tu és: o Santo de Deus’. Jesus, porém, o conjurou severamente: ‘Cala-te e sai dele’. Então o espírito impuro, sacudindo-o violentamente e soltando grande grito, deixou-o” (Mc 1,23-25).

2)      “Ao entardecer, quando o sol se pôs, trouxeram-lhe todos os que estavam enfermos e endemoninhados. E a cidade inteira aglomerou-se à porta. E ele curou muitos doentes de diversas enfermidades e expulsou muitos demônios. Não consentia, porém, que os demônios falassem, pois eles sabiam quem era ele” (Mc 1,32-34).

3)      “Um leproso foi até ele, implorando-lhe de joelhos: ‘Se queres, tens o poder de purificar-me’. Irado, estendeu a mão, tocou-o e disse-lhe: ‘Eu quero, sê purificado’. E logo a lepra o deixou. E ficou purificado. Advertindo-o severamente, despediu-o logo, dizendo-lhe: ‘Não digas nada a ninguém; mas vai mostrar-te ao sacerdote e oferece por tua purificação o que Moisés prescreveu, para que lhes sirva de prova’” (1,40-44).

4)      “Pois havia curado muita gente. E todos os que sofriam de alguma enfermidade lançavam-se sobre ele para tocá-lo. E os espíritos impuros, assim que o viam, caíam a seus pés e gritavam: ‘Tu és o Filho de Deus!’ E ele os conjurava severamente para que não o tornassem manifesto” (3,10-12).

5)      “Tomando a mão da criança, disse-lhe: ‘Talítha Kum’ – o que significa: ‘Menina, eu te digo, levanta-te’. No mesmo instante, a menina se levantou, e andava, pois já tinha doze anos. E ficaram extremamente espantados. Recomendou-lhes então expressamente que ninguém soubesse o que tinham visto. E mandou que dessem de comer à menina” (5,41-43).

Lançando um olhar sobre essa lista e outros textos, podemos ter uma resposta parcial à pergunta que fizemos à comunidade de Marcos a respeito do messianismo: por que Jesus impõe o silêncio e não permite que as pessoas mencionem seus títulos? Antes de tudo, Jesus desfaz um equívoco: a pretensão do povo em transformá-lo num Messias poderoso e triunfante. Foi exatamente essa pretensão que penetrou e dominou a comunidade de Marcos. Eles olhavam o céu, esperando e pedindo que Jesus interviesse logo no mundo para estabelecer seu reino glorioso e definitivo. Entretanto, ele os adverte e se contrapõe à figura messiânica davídica triunfalista. Dessa maneira, a comunidade começa a orientar seus membros para o verdadeiro messianismo de Jesus e seu destino na segunda parte do evangelho, que se inicia em Mc 8,27-38.

4. “Tu és Cristo”
Jesus com os seus discípulos estão em viagem para Jerusalém, próximos a Cesareia de Filipe, cidade situada no extremo norte da Palestina, junto às fontes do rio Jordão. O nome anterior dessa cidade era Panion, pois nela havia um local sagrado dedicado ao deus Pã (FREYNE, 2008, p. 53-54). Aí também havia um templo em honra de Augusto, construído por Herodes Magno. Herodes Filipe atribuiu à cidade o nome de Cesareia de Filipe, distinguindo-a de outras Cesareias.
No caminho, o Evangelho de Marcos insere a pergunta sobre a identidade de Jesus: “Quem dizem os homens que eu sou?” (Mc 8,27b). O caminho é o local do discipulado. A questão proposta não tem uma única resposta – até hoje as pessoas continuam tentando responder quem é Jesus. As diferentes respostas representam as várias opiniões existentes na comunidade de Marcos acerca de Jesus.
Alguns acreditavam que Jesus era João Batista que tinha voltado. De acordo com a narrativa de Marcos, o próprio Herodes pensava dessa forma (Mc 6,16). Para outros, era Elias, uma figura do Antigo Testamento muito popular entre os judeus. Ele era considerado o iniciador do movimento profético. A tradição afirmava que esse profeta tinha sido arrebatado aos céus e, segundo a crença, voltaria (2Rs 2,11). Ainda havia uma parcela da comunidade que acreditava que Jesus era um dos profetas.
A questão sobre a identidade de Jesus se desdobra em outra pergunta: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Pedro, representando um grupo que segue Jesus, responde: “Tu és o Cristo!” (Mc 8,29). Desde o início, o Evangelho de Marcos apresenta a verdadeira identidade de Jesus. Na voz do narrador ouvimos a proclamação de “Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1,1), em seguida pelo próprio Deus (Mc 1,11) e pelos demônios (Mc 1,25; 3,11; 5,7), somente agora pelos discípulos.
Embora a resposta de Pedro esteja certa, segue-se a ordem de silêncio. De fato, Jesus é o Messias, mas parece que a comunidade ainda não entendeu o seu messianismo, pois espera um Messias glorioso e poderoso. O Evangelho de Marcos apresenta que tipo de Messias é Jesus: “O Filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e pelos escribas, ser morto e, depois de três dias, ressuscitar” (Mc 8,31). Esse ensinamento será repetido em outras duas passagens: 9,31 e 10,32-34. O texto evidencia que o seguimento de Jesus implica sofrimento e rejeição.
O título “Filho do homem” ocorre muitas vezes no Antigo Testamento. Enquanto o título em Dn 7,13 é usado para designar “alguém como o rei Davi” que vem nas nuvens com poder e glória, o título no livro de Ezequiel é, de modo geral, aplicado ao ser humano com suas fraquezas e limitações humanas. Nos sinóticos (Mc, Mt e Lc), o título “Filho do homem” é usado somente por Jesus. Quando o título é usado nos textos que mencionam a paixão e morte de Jesus, ele é aplicado para expressar a condição humana de fragilidade, contrapondo-se à figura apocalíptico-escatológica do Messias davídico poderoso.
Anciãos, chefes dos sacerdotes e escribas foram os representantes das autoridades de Jerusalém que tramaram a morte de Jesus: “Enquanto ainda falava, chegou Judas, um dos doze, com uma multidão trazendo espadas e paus, da parte dos chefes dos sacerdotes, escribas e anciãos” (Mc 14,43; cf. Mc 10,33; 11,18.28; 14,1; 15,1.31). A visão de um Messias poderoso e triunfalista é substituída pela compreensão de um messianismo que passa pelo sofrimento e pela cruz. Um Messias solidário com os crucificados da história.
O messianismo de Jesus está relacionado com rejeição, sofrimento e morte, conteúdo essencial de sua identidade messiânica. Havia em Israel a imagem do Servo de Javé (Is 42,1-9; 49,1-6; 50,4-11; 52,13-53,12), porém ela ainda não estava relacionada com o Messias. O essencial desses cânticos é que o servo é chamado para o serviço da justiça, toma consciência do seu chamado e assume a missão. Por causa de sua fidelidade à justiça, é perseguido, resiste até o fim e por isso é morto, mas Deus aceita a sua oferta. As primeiras comunidades cristãs releram os cânticos de Isaías e viram em Jesus o Servo de Javé. Elas entenderam que o sofrimento do Filho do homem não vinha das mãos de Deus, mas “dos anciãos, chefes dos sacerdotes e escribas”.
Pedro representa o grupo que não aceita essa visão e censura Jesus. Para muitos, a morte de Jesus na cruz era inaceitável. Nesse momento, a reação é violenta: “Arreda-te de mim, satanás, porque não pensas as coisas de Deus, mas as dos homens” (8,33). Havia forte contestação a Jesus na comunidade de Marcos. Em 3,22, ele é acusado de estar possuído por Beelzebu. A provocação de Pedro a Jesus lembra também a tentação de Jesus no deserto (Mc 1,12-13). Pedro não age como discípulo de Jesus, ao contrário, torna-se porta-voz de satanás. A palavra satã vem do hebraico e significa “adversário”.
A narrativa de Marcos 8,27-33 tinha os discípulos como destinatários. No v. 34, há uma mudança: o discurso agora é dirigido para a multidão juntamente com os discípulos. O convite para seguir Jesus apresenta três exigências: “negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8,34). Negar-se a si mesmo supõe superar o egoísmo e arriscar a vida por causa de Jesus e do evangelho (Mc 8,35-37). A morte na cruz era extrema humilhação. A cruz era instrumento de crueldade e desumanização e representava a opressão romana. No tempo dos romanos, era castigo aplicado aos escravos e aos rebeldes. Um condenado à cruz tinha de carregar a própria até o lugar da crucifixão.
No caminho do discipulado, Pedro e os demais discípulos seguem Jesus e prometem fidelidade: “‘Mesmo que tenha de morrer contigo, não te negarei’. E todos diziam o mesmo” (Mc 14,31). Porém, diante do perigo, Pedro nega conhecer Jesus para salvar a própria vida (Mc 14,67-72). O mesmo aconteceu com o homem possuidor de muitos bens e incapaz de atender o chamado de Jesus (Mc 10,21-22).
Negar Jesus e seu evangelho pode ser um caminho de preservação da própria vida, mas a vida perde o seu sentido. De que adiantam riquezas e seguranças se a pessoa se fecha à solidariedade humana, distanciando-se da fonte da vida? “Envergonhar-se de mim e de minhas palavras” significa distanciar-se de Jesus e do seu evangelho e assumir a ideologia do império. O questionamento de Jesus a seus discípulos e à multidão continua a exigir uma resposta: até que ponto assumimos o seguimento de Jesus hoje?

5. Catecismo sobre o seguimento de Jesus
            “Tome a sua cruz e siga-me.” O seguimento de Jesus é o caminho da cruz, na contramão da sociedade dominada pelo império romano e seus colaboradores. É sociedade organizada pelas relações humanas baseadas no levar vantagem, no poder e em privilégios. A comunidade cristã de Marcos, que professa Jesus de Nazaré como “Cristo”, não deve reproduzir as relações de poder na vida cotidiana, mas estabelecer relações de serviço e de comunhão.
Após o primeiro anúncio da paixão, a comunidade de Marcos descreve, em seu evangelho, as instruções sobre as relações internas da comunidade, introduzidas pelo segundo (Mc 9,30-32) e terceiro anúncios (Mc 10,32-34):

1)      “E chegaram a Cafarnaum. Em casa, ele lhes perguntou: ‘Sobre que discutíeis no caminho?’ Ficaram em silêncio, porque pelo caminho vinham discutindo sobre qual era o maior. Então ele sentou, chamou os Doze e disse: ‘Se alguém quiser ser o primeiro, seja o último de todos e o servo de todos’” (Mc 9,33-35). Quem é o maior? Os discípulos ainda idealizam uma sociedade de poder, de riqueza e de privilégio que produz a segregação social. O caminho da cruz deve ser reproduzido nas relações humanas da comunidade, baseada na vida de serviço sem interesse.

2)      “Disse-lhe João: ‘Mestre, vimos alguém que não nos segue expulsando demônios em teu nome, e o impedimos porque não nos seguia’. Jesus, porém, disse: ‘Não o impeçais, pois não há ninguém que faça milagre em meu nome e logo depois possa falar mal de mim. Porque quem não é contra nós é por nós’” (Mc 9,38-40). Mais uma vez, deparamos com a concepção dos discípulos de uma sociedade segregacionista de poder. Eles não estão dispostos a partilhar o poder e o privilégio. Querem o monopólio e a exclusividade no mistério da salvação. Hoje se compreende que a prática missionária não é condenatória nem marcada por sectarismo. O cerne da missão é a promoção da justiça, da liberdade e da vida em todos os povos.

3)      “Traziam-lhe crianças para que as tocasse, mas os discípulos as repreendiam. Vendo isso, Jesus ficou indignado e disse: ‘Deixai as crianças virem a mim. Não as impeçais, pois delas é o reino de Deus. Em verdade vos digo: aquele que não receber o reino de Deus como uma criança não entrará nele’. Então, abraçando-as, abençoou-as, impondo as mãos sobre elas” (Mc 10,13-16). No mundo greco-romano de produção e de ganho, a criança e o ancião são considerados inúteis (cf. Sb 2,5-11) e representam o grupo marginalizado. Mas o reino, do ponto de vista de Jesus de Nazaré, é gratuidade de Deus, e nele as pessoas marginalizadas, que não são consideradas, são acolhidas.

4)      “Então Jesus, olhando em torno, disse a seus discípulos: ‘Como é difícil a quem tem riquezas entrar no reino de Deus!’ Os discípulos ficaram admirados com essas palavras. Jesus, porém, continuou a dizer: ‘Filhos, como é difícil entrar no reino de Deus! É mais fácil um camelo passar pelo fundo da agulha do que um rico entrar no reino de Deus!’” (Mc 10,23-25). A riqueza no império romano é fruto da acumulação de bens por meio da injustiça: fraudação, espoliação e violência (Ap 13; 18). Ao entrar no reino de Deus, na comunhão com o Deus da vida, é preciso sair e combater esta sociedade de ambição e injustiça, que explora o próximo e a natureza. É necessário entrar no caminho da cruz, de serviço e de partilha da vida.

5)      “Tiago e João, filhos de Zebedeu, foram até ele e disseram-lhe: ‘Mestre, queremos que nos faças o que te pedimos’. Ele perguntou: ‘Que quereis que vos faça?’ Disseram: ‘Concede-nos, na tua glória, sentarmo-nos, um à tua direita, outro à tua esquerda’. […] Ouvindo isso, os dez começaram a indignar-se contra Tiago e João. Chamando-os, Jesus lhes disse: ‘Sabeis que aqueles que vemos governar as nações as dominam, e os seus grandes as tiranizam. Entre vós não será assim: ao contrário, aquele que dentre vós quiser ser grande, seja o vosso servidor, e aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o servo de todos’” (Mc 10,35-44). O projeto de Jesus não é ser servido, mas servir o próximo. Assim, é rejeitada, definitivamente, a aspiração dos discípulos ao reino messiânico davídico no qual Jesus seria ungido como rei e assumiria o poder em Jerusalém. Essa rejeição é também da comunidade de Marcos por volta do ano 70 d.C. Ela rejeita juntar-se às revoltas armadas dos vários líderes messiânicos e suas lutas por poder e privilégios.

O Evangelho de Marcos registra três anúncios da paixão com o catecismo sobre o seguimento de Jesus na vida cotidiana da comunidade. Ao anunciar o catecismo do “caminho da cruz”, Jesus combate e corrige os discípulos que aspiram a poder e privilégios. É corrigida a aspiração messiânico-davídica ao poder de alguns membros da comunidade de Marcos. No caminho do seguimento de Jesus, ela deve empenhar-se em examinar sempre a natureza de sua missão no mundo.
A comunidade, como o cego Bartimeu (Mc 10,46-52), deve abrir os olhos, deixar o manto do “Filho de Davi” – Messias como rei poderoso – e seguir o caminho da cruz do Jesus servo sofredor. Deve despojar-se de tudo o que prega e busca o mundo de ambição pelo poder, riqueza e fama: “Pois o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mc 10,45).

6. Uma palavra final
Ontem e hoje persiste a pergunta: “Quem dizem os homens que eu sou?” As respostas são várias, e na comunidade de Marcos havia a imagem de uma figura messiânico-davídica gloriosa já esperada pelo povo judeu. Quem é Jesus? Onde ele está? Como podemos segui-lo? Uma das respostas para os nossos dias está na nossa realidade, em fatos como este do relato abaixo, feito por uma jornalista:

Minha filha caçula, orientadora pedagógica e psicóloga de crianças e adolescentes, chorou emocionada ao ouvir pelo rádio a entrevista que o estudante Vítor Soares Cunha deu ao sair do hospital, depois de ser agredido covardemente por jovens como ele. Vítor, 21, aluno de desenho industrial, passeava com um colega na Ilha do Governador, no Rio, quando viu cinco rapazes bem alimentados espancando um mendigo. Filho de um assistente social, não pensou duas vezes ao tentar impedi-los. A violência irracional voltou-se contra ele. Foram socos e pontapés violentos e ininterruptos, atingindo, sobretudo, a cabeça e rosto de Vítor, mesmo quando ele já estava caído no chão, totalmente indefeso. Depois de horas de cirurgias, placas de titânio na testa e no céu da boca, 63 pinos para recompor os ossos da face e ainda com o risco de perder os movimentos do olho esquerdo, Vítor saiu com sua mãe do hospital e disse, com uma simplicidade atordoante, que não se sentia heroico e que faria tudo novamente.[2]

Quem confessa Jesus de Nazaré como um dos caminhos para construir o reino de Deus é chamado a segui-lo nas atividades cotidianas, sendo solidário com os mais desprezados e rejeitados pelos poderes do mundo, seduzidos pela ambição das riquezas e honras que promovem a morte. Pois o reino de Deus se constrói nos movimentos de solidariedade entre as pessoas no dia a dia da vida: conscientizar e promover a dignidade humana; defender a vida e a natureza. A jornalista termina seu relato com esta reflexão: “A comparação entre Vítor e seus agressores nos faz refletir. O Brasil e o mundo serão muito melhores quando pais e escolas educarem as crianças não para se arvorarem fortes e machos ao trucidar um ser humano – ou um animal – jogado na rua, no abandono e na dor”.
Fonte: Revista Vida Pastoral

NO CAMINHO DE JESUS:

UMA LEITURA DO EVANGELHO DE MARCOS

“Princípio do evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1,1). O relato do Evangelho de Marcos se inicia com uma proposta de felicidade. É um novo começo marcado por um anúncio alegre e esperançoso. A boa-nova é de Jesus Cristo, Filho de Deus. Ele proclama a proximidade do reino: “Cumpriu-se o tempo, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1,15).
Jesus, com sua vida e prática, realizou o reino de Deus, abrindo espaços de vida para os pobres e marginalizados, porém, não compreendido [f1] pelos poderosos do seu tempo, foi perseguido e morto. A morte de Jesus foi um choque para os que esperavam que ele fosse um Messias poderoso e provocou a fuga de seus seguidores e seguidoras.
Mas, aos poucos, as pessoas que tinham experimentado uma vida nova com Jesus começaram a se reunir em pequenos núcleos que recordavam sua prática e ensinamentos à luz do Antigo Testamento. Assim, as primeiras comunidades cristãs compreenderam que Jesus era o servo sofredor: “O Filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e pelos escribas, ser morto e, depois de três dias, ressuscitar” (Mc 8,31; cf. Is 42,1-9; 52,13-53,12). No meio da febre messiânica de um rei poderoso, que viria para destruir os dominadores e instaurar o reino de Deus, a comunidade cristã teve dificuldades de manter e pregar Jesus como o Messias servo.
No século I, a dominação romana com seus impostos abusivos e o sistema religioso de Jerusalém tornaram-se insustentáveis. A realidade ia de mal a pior. Na Palestina, a repressão das autoridades contra as revoltas populares era violenta, um verdadeiro massacre, e muitos grupos de judeus foram dizimados. A população foi deixada à própria sorte. Nesse contexto, renasceu o nacionalismo judaico: a espera de um Messias rei. Para orientar a comunidade cristã, que também estava assumindo essa mentalidade, a liderança que escreveu o Evangelho de Marcos sentiu a necessidade de apresentar Jesus como o Messias servo, que foi crucificado por ter assumido a causa da justiça até o fim, mas a quem Deus ressuscitou (cf. Mc 9,30-32; 10,32-34).
O Evangelho de Marcos foi escrito entre os anos 65 e 70 d.C. A mão de ferro do império foi ainda mais pesada para os judeus e os cristãos. Em Roma, a comunidade cristã sofreu a perseguição de Nero (66 d.C.). Em vários pontos do império surgiram levantes dos judeus, sendo o principal na Palestina, conhecido como a Guerra Judaica, entre os anos 66-73 d.C. O medo era constante. Guerras, massacres, fome e aflições faziam parte do dia a dia das pessoas.

1. Situando o Evangelho de Marcos
            O Evangelho de Marcos é uma obra anônima; não existe apresentação do sujeito que fala nem sequer dos objetivos desse escrito, que somente serão descobertos na própria leitura. O que importa é a mensagem a ser comunicada: o evangelho. Marcos é nome de origem romana; porém essa assinatura é secundária, conhecida desde Irineu, no fim do século II.
Em relação à origem do Evangelho de Marcos, alguns afirmam que foi em Roma, logo após o martírio de Pedro, em 64 ou 67, outros a situam na Síria. Atualmente, os estudiosos acreditam que esse escrito tenha surgido na Galileia, hipótese que se apoia no fato de essa região ser o principal local da atividade missionária de Jesus. Há algumas informações que fortalecem essa teoria, por exemplo:

 

 

 

 

Evangelho de Marcos

Neste artigo trazemos alguns elementos e informações para a leitura e contextualização do evangelho de Marcos. Boa leitura!
  1. Autor
Seu autor é João Marcos. Sua mãe chamava-se Maria e acolhia em sua casa na cidade de Jerusalém uma pequena comunidade cristã (At 12,12). Marcos trabalhou com Barnabé, Paulo e com Pedro (At 12,25;13,5.13; 15,35-41; Fm 24; 2Tm 4,11,; 1Pd 5,13; Cl 4,10).
Marcos escreveu seu evangelho para os gentios possivelmente no ano 64/70 na Palestina ou em Roma. Estilo simples, seu evangelho responde a pergunta: Quem é Jesus? A resposta é cativante e original.
  1. Contexto
Graças à carta de Paulo aos Romanos, sabemos que a comunidade de Roma já existia a bastante tempo e ocupava um lugar de destaque por ser Roma a capital do Império (Rm 1,8; 16,19). As reuniões eram feitas nas casas (Rm 16, 3-5.10-11.14-15). O ministério era exercido também por mulheres, como a diaconisa Tebe (Rm 16,1) e a apóstola Júnia (Rm 16,6).
Quando o Evangelho de Marcos foi escrito, a comunidade de Roma passava por um período de insegurança e incertezas. Pelo ano de 62 a.C, as tensões políticas na Palestina desencadearam movimentos que levariam à guerra entre judeus e romanos, do ano 66 ao 70, quando os romanos arrasaram Jerusalém e o templo foi destruído. As principais lideranças da igreja foram sacrificadas: Tiago, bispo de Jerusalém, foi apedrejado em 62; Pedro e Paulo foram executados em Roma, entre 65/67, na perseguição promovida pelo imperador Nero.
Depois do suicídio de Nero em 68 d.C, estourou uma violenta guerra entre os generais ambiciosos pelo trono imperial até que, Vespasiano, comandante dos exércitos romanos na Palestina e no Egito, conseguiu o poder.
A comunidade dos cristãos em Roma viu-se mergulhada em incertezas. Aguardava para breve a chegada do Reino (Mc 9,1) e a volta triunfal de Jesus ressuscitado, o que justificava uma atitude de desprendimento (Mc 1, 17; 2,14-15; 3,13; 6,8-9; 10,21).
  1. O escrito de Mc
As “Palavras e Gestos de Jesus” que estavam espalhadas em vários documentos (folhetos) foram reunidas e organizadas num conjunto coerente. Daí surgiu um escrito atribuído a João Marcos, ou simplesmente Marcos, denominado de “evangelho”,  como solução para a comunidade em crise. Trazia mensagem de conforto, esperança, perseverança e fidelidade a Jesus, pelo caminho que Jesus abraçou, a cruz.  Dessa forma atualizavam a memória do Senhor ressuscitado pela qual confessavam-no como “filho de Deus” , profissão de fé que no texto vem da confissão de um soldado romano (Mc 15,39).
O Evangelho de Marcos, que afinal, é um trabalho feito em mutirão, porque reúne escritos anteriores, narrando milagres, parábolas, a paixão, atc, usa o grego falado pelo povo. Ele busca manter a memória de Jesus e seus ensinos adaptando a realidade e contexto social e religioso da comunidade visando seu fortalecimento e fidelidade em meio a crise, mostrando quem é Jesus.
  1. Chaves de leitura para ler Mc
O título do livro, logo no começo, nos dá uma chave de leitura: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc 1,1). Evangelho quer dizer “Boa Notícia” e aqui, esse verso, nos remete a pessoa de Jesus, como sendo ele mesmo, a boa notícia e seu fundamento. Só Marcos que traz esse título sobre Jesus. Por sinal, “princípio” é a mesma palavra que encontramos no início da criação, no livro de Gênesis. É como se Marcos tivesse nos dizendo: ‘com Jesus, começa uma nova criação’.
            Evangelho na tradição judaica é o anúncio da chegada do Reino de Javé (Is 40,9; 52,7; 61,7). Na cultura grego-romana é a proclamação das notícias relacionadas com os fatos e feitos do imperador. Usando esse titulo no contexto cultural romano, o autor está proclamando o verdadeiro evangelho, ou seja, a verdadeira notícia relacionada com o reinado de Deus presente na vida e na pessoa de Jesus de Nazaré. Acolher, pois, o evangelho é crer em Jesus e no mistério do reino que está acontecendo no meio da comunidade. Daí a importância dos títulos no evangelho de Marcos. Os títulos constituem uma chave de leitura de grande valor para a compreensão de Marcos.
            Poderíamos, também, tomar como chave de leitura os conflitos que perpassa toda a vida de Jesus neste evangelho. Ele assume os conflitos de maneira lúcida e a medida que vai crescendo até culminar na cruz.
            Os conflitos o encontramos em três blocos principais: as controvérsias; a crise da Galiléia; e a instrução aos discípulos.
  1. As controvérsias aparecem em três momentos cruciais:
  2. a primeira: Mc 2,1-3,6. O que está em jogo é o que se pode ou não se pode fazer em favor da vida. Começa com a acusação de blasfêmia, feita pelos escribas (Mc 2,7), e termina com o complô contra a sua vida (Mc 3,6);
  3. a segunda: Mc 7,1-23. Jesus se retira para Genesaré, mas Jerusalém manda emissários para espioná-lo. O que está em jogo são os valores da vida em face das exigências da Lei, isto é, a Justiça ou a Pureza. Jesus desautoriza as ‘tradições dos antigos’ e se retira estrategicamente para Tiro, território pagão;
  4. a terceira: Mc 11,1-13,12. É o enfrentamento direto com os representantes do poder: sacerdotes, anciãos, escribas, fariseus, saduceus, herodianos… acirra-se o conflito e se agrava a conspiração contra Jesus;
  1. A crise da Galiléia:
Essa crise (Mc 8,27-38), é marcada pela incompreensão do povo, dos discípulos e pelo assédio crescente do centro do poder que caminha para um desenlace violento e inevitável. Jesus se empenha em corrigir radicalmente as expectativas messiânicas equivocadas;
  1. A instrução aos discípulos:
A instrução aos discípulos (Mc 8,31-10,45) é polarizada pelos três anúncios da paixão (Mc 8, 31-33; 9, 30-32; 10, 32-34).
  1. Leitura geográfica
Para fins catequéticos, também podemos usar a leitura geográfica do texto, usando para isso o esquema do Evangelho como se encontra na Bíblia de Jerusalém.
  1. Preparação: 1,1-14;
  2. Ministério de Jesus na Galiléia: 1,14-7,23;
  3. Viagens de Jesus fora da Galiléia: 7,24-10,52;
  4. O ministério de Jesus em Jerusalém: 11,1-13,37;
  5. A paixão e ressurreição: 14-16.


1.    A atividade de Jesus: no Evangelho de Marcos, na maior parte de sua missão, Jesus atua na Galileia e nos seus arredores.
2.    O autor conhece as tensões existentes na Palestina e entre os diversos grupos e regiões. Para ele, os adversários de Jesus na Galileia vêm de Jerusalém (Mc 3,22; 7,1). Ele sabe que a Palestina e as regiões limítrofes não estão habitadas somente por judeus (Mc 7,24-25).
3.    Destinatário: embora haja judeus na comunidade de Marcos, os principais destinatários são gentios, pois o autor explica certos costumes e práticas judaicas – por exemplo, a lei do puro e do impuro (Mc 7,1-23) –, como também o uso de termos aramaicos e sua tradução em momentos-chave da narrativa, como: Talitha kum, “menina, levanta-te” (Mc 5,41); Effatha, “abre-te” (Mc 7,34); Abba, “pai” (Mc 14,36); e Eloi, Eloi, lemá sabachtáni, “meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes” (Mc 15,34).

Com base nessas informações, acreditamos que o Evangelho de Marcos foi escrito na região da Galileia, destinado às comunidades localizadas na região da Síria, de Tiro e da Decápolis.

2. Pisando o chão da comunidade de Marcos
Desde 63 a.C., os romanos dominaram a Palestina. As províncias da Galileia, da Pereia, da Idumeia e da Judeia passaram a pagar tributos ao império. O povo passou a ser violentamente explorado por meio da cobrança abusiva de impostos e do monopólio do comércio. Essa situação gerou muitas revoltas, principalmente na Galileia. Qualquer revolta dentro do império era terminantemente sufocada por meio de forte aparato repressor. A região de Israel representava apenas 1% do território romano e havia 8% das tropas do exército romano acampadas na região. Várias cidades da Galileia foram incendiadas e destruídas, e suas populações foram vendidas como escravas ou mortas.
Em torno do ano 40 a.C., por sua fidelidade às políticas de paz de Augusto, Herodes Magno foi reconhecido como rei dos judeus, exercendo o governo de forma tirânica e opressora. Seguindo o exemplo do imperador Augusto, Herodes reconstruiu várias cidades; por exemplo, no lugar de Samaria, a antiga capital do Norte, fundou Sebaste – tradução grega de Augusto –, onde havia um grande teatro e um templo dedicado ao imperador. No seu reinado, várias cidades helenísticas foram reconstruídas ou revitalizadas, entre as quais Cesareia, em homenagem a César Augusto. A fronteira oriental do seu reino, inclusive a fortaleza de Massada, foi reforçada.
Herodes gastou enormes quantias de dinheiro com as construções da cidade de Jerusalém, principalmente com o Templo, totalmente reconstruído, uma reforma que terminou pouco tempo antes da Guerra Judaica (66-73 a.C.). Devia ser uma construção suntuosa, pois sua beleza e esplendor permaneciam no imaginário das primeiras comunidades cristãs (cf. Mc 13,1-2; Mt 24,1; Lc 21,5-7).
O sistema de fiscalização de impostos, instituído por Herodes e seus partidários, era muito rígido. O povo tinha de pagar aos romanos o imposto sobre 25% das colheitas, o pedágio para a circulação de pessoas e mercadorias e dedicar um tempo de trabalho forçado para as tropas. Além do sistema de cobrança dos romanos, existiam os impostos do Templo: o imposto pessoal, estipulado em um denário – o equivalente à diária de um trabalhador; os vários dízimos, como, por exemplo, das colheitas, a parte destinada aos pobres; e, a cada sete anos, o produto referente a um ano de trabalho.
Nesse caldeirão de opressão surgiram muitos focos de revolta. Porém o controle de Herodes Magno era muito rígido, e os protestos eram sufocados. Após sua morte, a Palestina foi dividida em três regiões ou províncias. Herodes Antipas (4 a.C. a 39 d.C.) ficou como tetrarca da Galileia e da Pereia ou Transjordânia do Sul, Filipe assumiu a Transjordânia do Norte e Arquelau ficou com a Judeia e a Samaria.
Na tentativa de agradar ao povo judeu e ao império romano, Herodes Antipas empreendeu grandes construções conforme os padrões helenísticos, como a reconstrução de Séforis e a fundação da cidade de Tiberíades, em 19 d.C., transformando-a em capital de sua província. A maioria da população de Tiberíades era constituída de gentios de diversas regiões, aí se falava o grego, o aramaico e o latim. Na cidade havia teatros, banhos públicos e estádios. Estava situada entre o mar da Galileia e a cidade de Cesareia, no Mediterrâneo.
Herodes Antipas chegava a receber em torno de 200 talentos por ano, o equivalente a 1,2 milhão de denários, referentes ao imposto da pesca. A moeda era necessária para o pagamento dos impostos e a compra de produtos e serviços (Mc 12,15-17). Crescia o número de pessoas endividadas e escravizadas. Uma pequena minoria, cerca de 5%, esbanjava luxo, mas a maioria experimentava pobreza e miséria. O cenário era de doença e escravidão. Muitas pessoas empobrecidas perambulavam pelas praças e mercados, sem terra e sem emprego (cf. Mt 20,1-9). A situação dos pobres se complicava ainda mais por causa da cultura e religião da época.
De acordo com a mentalidade grega, os pobres eram considerados vagabundos ou pessoas não agraciadas pelas divindades. Os romanos, seguindo a mesma mentalidade grega, acreditavam que o trabalho era próprio dos escravos. Para impedir qualquer tipo de revolta, havia o sistema do clientelismo, também conhecido como patronato.
O clientelismo era baseado nas relações de troca. Alguém do estrato superior beneficiava uma pessoa do estrato inferior, que se tornava cliente de seu benfeitor. O prestígio e a honra de um cidadão eram medidos com base no número de clientes que possuía. Por sua vez, o cliente tinha várias obrigações com o seu patrono – por exemplo, estar presente nos banquetes patronais, acompanhar seu patrono nas aparições públicas e aplaudir seus discursos. No império romano, a ingratidão de um cliente ao seu patrono era considerada pior do que roubo e homicídio. Hoje, em linguagem popular, diríamos que é o bajulador ou o puxa-saco, com a diferença de que essa relação estava presente em todos os setores da sociedade. Esse sistema não favorecia os pobres, mas reforçava a situação de injustiça e perpetuava a submissão.
Na cultura judaica, a partir da consolidação da teologia da retribuição no exílio e no pós-exílio, a pobreza constantemente era associada com castigo de Deus. De acordo com essa teologia, Deus recompensava a pessoa justa com vida longa, riqueza e descendência. O caminho da sabedoria era seguir a Lei; assim afirma o livro dos Provérbios: “Em sua direita: longos anos; em sua esquerda: riqueza e honra! Seus caminhos são caminhos deliciosos, e os seus trilhos são prosperidade” (Pr 3,16-17).
No século I havia muitas pessoas pobres e doentes. Uma pessoa com lepra era considerada morta. Qualquer doença de pele, contagiosa ou não, era classificada como lepra. Havia muitas pessoas aleijadas, epiléticas e hidrópicas. Doenças mentais e psíquicas eram associadas com o demônio; por exemplo, os casos de mudez, surdez, epilepsia, esquizofrenias e até mesmo a depressão ou falta de motivação.
No tempo de Jesus e das primeiras comunidades, as leis referentes à pureza marginalizavam os doentes leprosos (Lv 13 e 14). Todos os líquidos relacionados com a reprodução que saíam do corpo humano provocavam impureza. A pessoa impura estava excluída da participação social. Havia muitas pessoas à margem da sociedade e, para piorar a situação de sofrimento, sentiam-se abandonadas por Deus: “Ao entardecer, quando o sol se pôs, trouxeram-lhe todos os que estavam enfermos e endemoninhados” (Mc 1,32)
Ser pobre significava não ter existência social. A situação de opressão e escravidão deu origem a vários movimentos proféticos e messiânicos, especialmente na Galileia, região que fornecia trigo, vinho, óleo, carne e peixe e que, por isso mesmo, foi o território mais explorado e devastado. Entre os vários movimentos, podemos situar o de Jesus. A sua proposta de reino de Deus atraiu homens e mulheres que perderam suas terras e se encontravam sem reino. Por isso, Jesus proclama: “Felizes vós, os pobres” (Lc 6,20; Mt 5,3).

3. Conhecendo a proposta do Evangelho de Marcos
No norte da Galileia, por volta do ano 70 d.C., a comunidade de Marcos estava tentando seguir o projeto de Jesus de Nazaré. Além dos conflitos externos, como a violência, a fome e os apelos dos movimentos nacionalistas com o messianismo do rei, internamente a comunidade enfrentava conflitos étnicos e culturais. O modo de vida romano e a busca desenfreada de bens, poder e privilégios foram assimilados por muitas pessoas: “Concede-nos, na tua glória, sentarmo-nos, um à tua direita, outro à tua esquerda” (Mc 10,37).
Mas não obstante as dificuldades, a comunidade de Marcos procurava resgatar e seguir o projeto de Jesus de Nazaré, apresentando Jesus como o Messias servo e as condições para segui-lo. Entrar nesse discipulado exige “deixar as redes” e ter disposição para aprender de Jesus estratégias para a concretização do reino de Deus. É preciso sair e ultrapassar fronteiras. Só é possível construir o reino com base em relações tecidas na fraternidade e no serviço: “Entre vós não será assim: ao contrário, aquele que dentre vós quiser ser grande, seja o vosso servidor, e aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, seja o servo de todos” (Mc 10,43-44).
O Evangelho de Marcos nasce da necessidade da comunidade de pôr por escrito suas memórias sobre quem é Jesus, reforçando que ele não é o Messias do poder e da glória, pois seu messianismo passa pelo sofrimento e pela cruz. Eis alguns pontos principais desse texto:

1) Quem é Jesus de Nazaré. O evangelho apresenta Jesus como o Filho do homem na figura do servo sofredor, que veio conviver com as pessoas empobrecidas, exploradas e excluídas pelo império e seus colaboradores e libertá-las. Proclamou o reino de Deus a todas as pessoas, independentemente da etnia, da classe social, do gênero e da religião. A sua fidelidade ao projeto do reino da justiça e da fraternidade o levou a um confronto com os poderosos do seu tempo e, consequentemente, à cruz, mas Deus o ressuscitou: “o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mc 10,45).
2) O seguimento de Jesus. Esse evangelho apresenta mulheres e homens que seguem Jesus desde a Galileia até Jerusalém, convivendo e aprendendo com ele. Com suas limitações, esse grupo assumiu a causa do reino de Deus, fundamentado na justiça e na solidariedade, no meio das pessoas que estavam à margem da sociedade, como mulheres, pobres, estrangeiros, crianças e doentes (Mc 1,31; 6,33; 7,28; 8,1; 10,13.46). Seguir Jesus implica assumir o mesmo caminho seu como servo sofredor: “Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois aquele que quiser salvar sua vida a perderá; mas o que perder sua vida por causa de mim e do evangelho, a salvará. Com efeito, que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro e arruinar sua própria vida?” (Mc 8,34-36).

4. Uma estrutura possível para o Evangelho de Marcos
Há diversas propostas de estrutura para o Evangelho de Marcos. Para uma visão de conjunto, optamos pela divisão em três partes, seguindo o ministério de Jesus na Galileia e nos seus arredores, depois a caminhada para Jerusalém e, por fim, os últimos acontecimentos em Jerusalém.
Eis um breve esquema:

1) Primeira parte (1,1-8,26): a atividade de Jesus na Galileia e nas regiões vizinhas.Nesta etapa, temos a formação da comunidade, que se encontra com Jesus sempre em uma casa. A comunidade enfrenta vários problemas externos e internos, a saber: fome, doenças, individualismo, preconceito e, especialmente, a tentação de seguir o Messias como rei poderoso (Mc 1,34.44; 3,12; 5,43; 6,30-44; 7,36). Essa parte termina com a cura do cego de Betsaida (Mc 8,22-26), indicando que a comunidade precisa abrir os olhos para compreender que Jesus é o Messias servo.
2) Segunda parte (8,27-10,52): a viagem para Jerusalém a partir da Galileia. É um caminho para compreender e aprofundar Jesus como o servo sofredor, com os três anúncios da paixão (Mc 8,31-33; 9,33-37; 10,32-34). É uma catequese sobre o seguimento de Jesus na vida cotidiana da comunidade. Ao anunciar o “caminho da cruz”, Jesus combate e corrige os discípulos que aspiram a poder e privilégios, atributos que transparecem na figura do Messias poderoso como Davi. Os versículos finais apresentam a cura do cego Bartimeu, que joga o manto, gesto que significa abandonar a visão messiânica de rei e seguir Jesus no caminho da cruz (Mc 10,46-52).
3) Terceira parte (11,1-16,8): o ministério de Jesus em Jerusalém com a sua paixão, morte e ressurreição. A prática libertadora de Jesus está em conflito com os poderes do mundo, por isso ele é condenado e morto como subversivo. Mas Deus não abandona o justo (Sb 2,18) e o ressuscita (Sl 22). Essa parte termina com a ordem de voltar para a Galileia, o local onde Jesus começou sua prática libertadora e onde exerceu por mais tempo esta atividade.
4) Acréscimo posterior (16,9-20). Como terminar um evangelho com o medo e o silêncio? Os versículos finais foram acrescentados depois e constituem uma síntese dos relatos das aparições de Jesus ressuscitado. Na origem, o evangelho era uma obra sem conclusão. Ela está em aberto e depende de que a pessoa que lê dê a sua resposta… É preciso ter coragem para voltar à Galileia.

O Evangelho de Marcos termina com uma ordem e o medo como resposta: “‘Não vos espanteis! Procurais Jesus de Nazaré, o crucificado. Ressuscitou, não está aqui. Vede o lugar onde o puseram. Mas ide dizer aos seus discípulos e a Pedro que ele vos precede na Galileia. Lá o vereis, como vos tinha dito’. Elas saíram e fugiram do túmulo, pois um temor e um estupor se apossaram delas. E nada contaram a ninguém, pois tinham medo…” (Mc 16,6-7).
As mulheres recebem a ordem de comunicar aos seus que ele voltaria para a Galileia. Elas ficaram com medo, fugiram e nada disseram. É preciso afastar-se de Jerusalém, lugar do centro do poder, e voltar à Galileia, o lugar onde tudo começou. Segundo o Evangelho de Marcos, foi na Galileia que Jesus realizou grande parte de sua atividade missionária. Voltar à Galileia é assumir o seu projeto, e isso causa medo. Acreditar que Deus o ressuscitou é reafirmar a fé em Deus como o Senhor da vida. Apesar do medo, há grande esperança para os que seguem Jesus.
A nossa missão é anunciar que Cristo ressuscitou e nos precede na nossa Galileia: lugar onde a vida está ameaçada. Assumir o projeto de Jesus dá medo e, muitas vezes, é melhor fugir. É preciso viver a experiência de que há uma esperança: a força da vida é maior do que a morte. É preciso acreditar que “a pedra já foi removida!”
Fonte: Revista Vida Pastoral

“Curta e Compartilhe”.

Prepare adesivos ou cartões semelhante ao ícone usado pelo Facebook para indicar que você curtiu algo. No início do encontro convide os jovens a fazer daquele lugar uma grande sala virtual onde vamos encontrar nossos amigos, curti-los e compartilhar algo sobre a vida deles. Coloque uma música bem animada e, durante a música, eles devem se cumprimentar, desejar as boas vindas e, de forma bem espontânea, distribuir os adesivos de “CURTIR” entre os amigos. Você pode preparar vários adesivos, de modo que todos sintam-se à vontade para curtir quantos amigos quiserem.

Ao final desse momento, em círculo, fazem uma breve partilha desta acolhida, contando quantos adesivos cada um recebeu, se gostou de curtir e ser curtido pelo amigo, etc.


Após a acolhida, vem a segunda parte da dinâmica, o momento de compartilhar. Cada jovem vai ao centro do círculo e os amigos devem compartilhar algo sobre ele, uma curiosidade, um fato engraçado, um testemunho, etc. Nesse momento, o catequista deve estar atento para que ninguém se sinta constrangido e para que não aconteçam comentários desagradáveis. É importante respeitar as particularidades de cada jovem. Depois da partilha, o catequista deve fazer uma reflexão com os jovens sobre este momento. Perguntar: Como se sentiram ao ouvirem seus amigos falando sobre você? É mais fácil falar sobre o outro ou ouvir os que as pessoas tem a dizer a seu respeito? Alguma vez, já passaram por esta experiência de estar diante de pessoas falando sobre você?

Aos poucos, ir conduzindo o diálogo para a realidade dos jovens nos dias de hoje, perguntando: Como costumam se relacionar com os amigos? Que papel a internet tem nas nossas vidas e nos relacionamentos nos dias de hoje?

Provavelmente, durante esta brincadeira, os amigos compartilharam somente coisas boas uns dos outros, perguntar se na internet isso também acontece ou se, algumas vezes divulgamos notícias desagradáveis sobre nossos amigos... enfim, o catequista deve guiar o diálogo e a reflexão de acordo com a realidade do seu grupo.

Para concluir esse momento, deixo como sugestão o seguinte texto:

As Três Peneiras 
(Sócrates)

Um homem foi ao encontro de Sócrates levando ao filósofo uma informação que julgava de seu interesse:

- Quero contar-te uma coisa a respeito de um amigo teu!

- Espera um momento – disse Sócrates – Antes de contar-me, quero saber se fizeste passar essa informação pelas três peneiras.

- Três peneiras? Que queres dizer?

- Vamos peneirar aquilo que quer me dizer. Devemos sempre usar as três peneiras. Se não as conheces, presta bem atenção. A primeira é a peneira da VERDADE. Tens certeza de que isso que queres dizer-me é verdade?

- Bem, foi o que ouvi outros contarem. Não sei exatamente se é verdade.

- A segunda peneira é a da BONDADE. Com certeza, deves ter passado a informação pela peneira da bondade. Ou não?

Envergonhado, o homem respondeu:

- Devo confessar que não.

- A terceira peneira é a da UTILIDADE. Pensaste bem se é útil o que vieste falar a respeito do meu amigo?

- Útil? Na verdade, não.

- Então, disse-lhe o sábio, se o que queres contar-me não é verdadeiro, nem bom, nem útil, então é melhor que o guardes apenas para ti.


Que possamos usar sempre estas peneiras em nossas vidas,
tendo o cuidado de fazer bom uso desta ferramenta
chamada internet.


 


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